Monsenhor
Rafael
Memórias,
feitos e profecias de um pastor.
Maria da
Conceição Carvalho Barros
Selma
Barcelos Gomes de Oliveira
Jovita
Maria Barros Barcelos
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Monsenhor Rafael.
Foto : Acervo Mauro Sérulo. |
Memórias
Recorrendo à
memória, como numa viagem ao túnel do tempo, volto os idos
de 1953...
Tentarei
ser fiel às lembranças, decorridos que foram 60 anos...
Esforçar-me-ei para trazer à tona aquele encanto, aquele
misticismo, aquele mistério, aquela simplicidade que
envolvia o Monte, a lembrança daquela singela menina, Maria
Cornélia, a chegada das primeiras Irmãs da Beneficência
Popular e a recordação do saudoso Monsenhor Rafael,
religioso de físico imponente, de inesquecível
espiritualidade e de uma visão social à frente do seu tempo.
Ainda
crianças, eu, meus irmãos, algumas crianças vizinhas,
subíamos ao Monte, todas as tardes, levados pela nossa mãe,
que sempre se fazia acompanhar por outras mães da
vizinhança.
Ali,
rezávamos o Terço e cantávamos com alegria e encantamento:
“Aqui neste Monte,
Bem
perto do Céu
A
Virgem Maria nos apareceu...”
Talvez
ainda não tivéssemos a consciência cristã, a maturidade
necessária para entendermos a grandeza daquele mistério,
mas, o exemplo dos adultos nos entusiasmava, e lá íamos nós,
peregrinando ladeira acima, visitar Nossa Senhora do Monte.
Essa
visita, todas as tardes, nos conduzia também ao encontro de
Monsenhor Rafael, um vigário alegre, brincalhão, que nos
convidava a entrar na escola de Jesus e nossas mães nos
diziam que “ele servia com humildade e gratuidade à Igreja,
a Jesus, a Nossa Senhora e a todos paroquianos”. A Paróquia,
naquela época, com algumas exceções, era formada de pessoas
simples, mas muito fervorosas.
Falar de
Monsenhor Rafael e não recordar as primeiras sextas feiras
seria deixar uma grande lacuna entre o tempo e as
lembranças...
Hoje
compreendemos a importância dessa devoção particular do
Monsenhor Rafael pelo Sagrado Coração de Jesus, devoção essa
que arrastava os alvinopolenses da cidade e do meio rural,
em busca da Sagrada Eucaristia, dos ritos sagrados que
iniciavam à meia noite da quinta feira e se estendiam até o
amanhecer da primeira sexta feira. Irmandades da época se
revezavam nas adorações ao Santíssimo Sacramento, ritual
esse que se adentrava na noite, terminando ao amanhecer.
Meu pai,
João de Vina, na época era barbeiro, e já nas primeiras
horas da tarde, recebia os fiéis devotos, vindos das mais
diversas comunidades rurais, para cortar o cabelo, fazer a
barba, para aquele encontro com o Coração de Jesus. E ali,
naquela barbearia, curiosamente, nós ouvíamos, dos fregueses
narrações de graças alcançadas e também dos pedidos que
vinham fazer ao santo de sua devoção.
Ao
Monsenhor Rafael pediriam as bênçãos para as lavouras que
não iam bem, pelo gado minguado, e pela solução de outros
problemas ligados a terra. Para todos eles Monsenhor Rafael
tinha uma palavra inteligente e amiga, em busca de uma
solução favorável.
Como um
homem à frente de seu tempo, Monsenhor promovia, naquela
época, inúmeras Exposições Agrícolas e Semanas do Lavrador,
em Alvinópolis.
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Convite III Semana do Lavrador - 1949
Acervo: Amaury Martino |
Eram eventos muito concorridos, quando podíamos apreciar,
nos Salões da Beneficência Popular, os mais diversos
trabalhos artesanais, desde bordados, tricô, crochê, a
quitandas, doces de frutas cristalizadas, dos mais variados
gostos e sabores.
De seus
sítios, produtores incentivados pelo dinamismo de Monsenhor
Rafael, traziam para a Exposição frutas, legumes e verduras
variados. Abóboras gigantes, espigas de milho enormes, aves
de raça, vacas leiteiras e reprodutores majestosos, e tudo
isso encantava os alvinopolenses.
Para termos
acesso ao local tínhamos que conseguir um distintivo (era o
nome da época e hoje é o que chamamos de botton), que trazia
uma formiguinha, como símbolo do trabalho.
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Distintivo Formiguinha - 1949
Acervo : Amaury Martino |
Nestas
ocasiões, para os adultos, homens e mulheres, eram
programadas palestras com Técnicos Agropecuários e aulas de
Economia Doméstica, para as esposas e filhas dos
agricultores.
Monsenhor
Rafael preocupava-se muito com o destino das crianças e
adolescentes, e por isso assumia a criação de creches,
orfanatos e pastorais ligadas às mães gestantes.
Nessa sua
preocupação com as crianças é que, trazida pelas suas mãos,
chegou a Alvinópolis a pequena órfã Maria Cornélia, a quem
foi atribuída a aparição de Nossa Senhora, em 11 de novembro
de l953, dando origem a peregrinação de devotos, ao louvor
intenso à Mãe do Céu e a todo esse mistério e misticismo que
envolve o Monte Santo, que abriga o Oratório da Mãe de
Jesus.
Sessenta
anos se passaram e a peregrinação, os pedidos de graças, o
apelo, a visitação e as orações dos fiéis que continuam
louvando a amada Mãe Maria, naquele recanto bem perto do
Céu, constituem uma bela e piedosa realidade em nossa
Alvinópolis e uma saudosa lembrança do Monsenhor Rafael.
Maria da Conceiçao Carvalho Barros é alvinopolense,
professora e escritora.
Contato :
mariahcbarros@gmail.com
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Roupas usadas por Monsenhor Rafael.
Acervo : Memorial Monsenhor Rafael, localizado
na Beneficência Popular, Monte Santo,
Alvinópolis.
Foto : Marina Carvalho |
Nossa
Paróquia se orgulha...
Um sacerdote
altivo, fervoroso, carismático, enviado de Jesus chega para
cuidar de
Um rebanho:
Monsenhor Rafael Arcanjo Coelho.
Profeta no
nome e no porte elegante!
Rafael como o
Anjo que veio para curar, servir e proteger!
Alvinópolis
não é mais a mesma... Ele funda a Congregação das Irmãs,
renova os ritos e a fé e estabelece a celebração das
primeiras sextas feiras...
Funda as
Irmandades do Coração de Jesus e das Filhas de Maria.
Fortalece as
festas de Maio e a Coroação de Nossa Senhora, onde as
crianças enchiam de inocência e de beleza a nossa Igreja
Matriz. Na seqüência, a Adoração do Santíssimo Sacramento,
acontecia sob o perfume do incenso...
Enfim, a
divulgação da fé, o amor à Rainha do Rosário e a devoção ao
Coração de Jesus, eram fortalecidos!!!
Renovador
incansável! Mente brilhante, ele ergue a Beneficência
Popular e suas obras fraternais e solidárias. O amparo aos
órfãos e o ensino de profissões elementares e básicas,
tornaram-se realidades.
Como se isso
não bastasse esse Monsenhor ilustre convida o Sr.Luiz
Kuchembecker (um alemão especializado em agricultura) e cria
o plantio do eucalipto no Monte. Um ato de pioneirismo que
traz para Alvinópolis as primeiras e grandes Exposições
Agrícolas, que enchiam de festa, alegria e orgulho os
produtores rurais de Alvinópolis.
Da Agronomia
passou para a Agropecuária e, mais tarde, à famosa Exposição
Agro Pecuária e Industrial de Alvinópolis, onde a Fabril
Mascarenhas se mostra ao Brasil e ao mundo e se mantém em
posição de destaque até hoje.
Monsenhor
Rafael, hoje Alvinópolis se curva a esta celebração à
Virgem, e agradece a Deus por ter, em tempos idos, nos
enviado tão ilustre Pastor, que viveu muitos anos entre
nós...
Obrigado,
Senhor!
Ele veio,
produziu, frutificou, evangelizou e se imortalizou por suas
obras, por nós e entre nós!
Que Deus o
abençoe, Monsenhor Rafael, e marque na fé sua presença
eterna entre todos
alvinopolenses.
Homenagem
da professora alvinopolense - Selma Barcelos Gomes de Oliveira
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Confessionário usado por Monsenhor Rafael.
Acervo : Memorial Monsenhor Rafael, localizado
na Beneficência Popular, Monte Santo,
Alvinópolis.
Foto : Marina Carvalho |
Pastor
profético
Monsenhor
Rafael possuía uma extraordinária visão de Profeta, pois ao
mesmo tempo em que assumia os problemas religiosos e sociais
daquele tempo, antevia o futuro.
Nos muitos
diálogos que tínhamos, um dia eu o questionei sobre a
abstenção, ainda timidamente cogitada, do uso da batina
pelos sacerdotes e do hábito pelas religiosas, ele sorrindo
e tocando em meu ombro, respondeu-me:
-
Filhinha, você ainda verá tudo isso acontecer. Os sacerdotes
e freiras se despojarão dessas vestes para terem livre
acesso aos paroquianos, sem intimidá-los.
Não se
preocupe, pois se concretizará a premissa de que “o hábito
não faz o monge. E isto não está longe de acontecer”.
E a profecia
se realizou!
Homenagem
da alvinopolense - Jovita Maria Barros Barcelos
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